A política imperial de imigração
O tema da imigração no Brasil oitocentista toca em um ponto nevrálgico na história brasileira: o problema do trabalho em um país sustentado pela mão de obra negra e escrava, que vislumbra o fim do regime escravista.
Se para os grandes senhores de terras e escravos brasileiros a lei de abolição do tráfico de 1850 representou um duro golpe na reposição dos braços escravos africanos que cultivavam o café nas fazendas do Vale do Paraíba e moviam a roda da economia do Império, abriu, ao mesmo tempo, as portas para que a política de imigração do Estado finalmente deslanchasse. Amparada na Lei de Terras, daquele mesmo ano de 1850, que restringia o acesso às terras devolutas no Brasil e concentrava ainda mais a propriedade nas mãos da elite imperial, a imigração aparece como solução para repor a mão de obra sem, no entanto, comprometer a estrutura fundiária vigente.
Entretanto, esse momento crucial de crise do trabalho gerou dois projetos distintos de incentivo à vinda de estrangeiros - do Estado e dos grandes lavradores. Para os estadistas, a imigração europeia era parte de um processo civilizatório que pretendia "regenerar" a agricultura e o trabalho do atraso e dos vícios adquiridos em séculos de exploração dos africanos, e levar a um consequente "embranquecimento" da população, ao passo que para os agricultores, o sentido era econômico. Para estes, pouco importava a origem dos imigrantes, desde que fossem muitos, tão pobres que não tivessem acesso à terra e estivessem propensos a suportar uma rotina exaustiva de trabalho como os escravos. E desde que o Estado arcasse com as despesas de trazê-los. Esta visão de que os imigrantes deveriam substituir quase literalmente os escravos nas fazendas por pouco não comprometeu irremediavelmente o processo imigratório brasileiro, que alcançou seu auge, de fato, na primeira década da República, período posterior à abolição da escravidão.
Imigrantes de várias nacionalidades, e sobretudo os italianos, vinham para o Brasil iludidos pela propaganda de enriquecimento rápido e pela esperança de se tornarem também proprietários de terra. Deixavam suas vilas e regiões, assaltados pela pobreza e pela falta de perspectiva, esperançosos de uma vida próspera do outro lado do oceano. Ao chegar, na maior parte das vezes, encontravam nas fazendas uma realidade muito diferente: endividamento, exploração do trabalho e maus-tratos, herança da cultura de violência aplicada aos escravos e associada ao trabalho braçal. Nas colônias, a situação não era muito melhor: a carência de moradias apropriadas, as doenças e a falta de condições para produzir levaram muitos dos milhares de italianos e outros estrangeiros que chegaram a partir da década de 1870 a abandonarem as fazendas e as colônias, fugindo das péssimas condições de vida, dos contratos e das dívidas que os prendiam às terras.