Ir direto para menu de acessibilidade.
Início do conteúdo da página

As cidades americanas

Durante o século XIX, os Estados Unidos enveredaram por um processo de transição de país predominantemente agrário para industrializado, aumentando o número da população residente em cidades, algumas das quais, em poucas décadas, se transformaram em metrópoles. A urbanização do país, impulsionada pela vertiginosa industrialização, foi também tributária da migração campo-cidade e das correntes imigratórias provenientes da Europa. Esse crescimento populacional, especialmente acentuado nas últimas décadas do século XIX, fez com que as grandes cidades passassem a dominar a paisagem norte-americana.

Uma característica marcante do processo de urbanização do país foi a especialização de usos do território – quarteirões de negócios, distritos industriais e áreas residenciais foram aos poucos tomando forma. Para os distritos de negócios, convergiam edifícios de bancos, seguradoras e firmas de advocacia, além de lojas de comércio atacadista e varejista. Foi nessa região que se empregou primeiramente um novo método de construir que alterou em definitivo não só as feições das cidades americanas, mas de cidades em todo o mundo – os arranha-céus. As áreas residenciais, por sua vez, experimentaram a proliferação das casas geminadas, forma de produção em massa de moradia que permitiu o adensamento populacional.

A virada do século XIX para o XX, nos Estados Unidos, foi também um momento especial para a arquitetura, que marcou época ao produzir edifícios que se tornariam icônicos. Arquitetos, que posteriormente alcançariam projeção internacional, tiraram partido de novos materiais, como o ferro e o aço, e de novas técnicas construtivas, como as estruturas metálicas internas de sustentação, para criar uma verdadeira revolução na arte de construir. No plano estético, forjaram o estilo revivalista, que revisitava e atualizava estilos arquitetônicos europeus, trazendo novas feições às edificações. No campo da tecnologia, inventos como o elevador, a iluminação elétrica, o telefone e os veículos movidos a vapor foram sendo incorporados, permitindo que as cidades crescessem e se verticalizassem.

Nova Iorque, Chicago, Boston e Filadélfia despontaram nesse cenário e converteram-se em símbolos da pujança econômica norte-americana. Complexas no que diz respeito à sua estrutura espacial, tornaram-se hegemônicas do ponto de vista estético e político, o que faz com que suas trajetórias permaneçam como objeto de estudo até os dias de hoje. Impressionantes artefatos culturais, não por acaso exemplos da arquitetura produzida nessas cidades, encontram-se nos álbuns de Albert Lévy.

O fotógrafo

Albert Lévy (1844-1907) foi um fotógrafo francês, especializado em fotografias de arquitetura. Atuava na França e nos Estados Unidos simultaneamente, tendo ateliês nas cidades de Paris e Nova Iorque. Além de fotógrafo, também empreendeu no ramo de manufatura de placas secas de gelatina para fotografia e como editor. Desenvolveu mais de trinta séries fotográficas, cada uma contendo entre trinta e quarenta imagens, nas quais documentou a arquitetura americana. Além disso, fotografou arquitetura em diversos países europeus, compondo um catálogo de 2.500 imagens, hoje disponível on-line na Biblioteca Nacional da França.

O álbum A arquitetura americana

L’architecture américaine, álbum organizado por Albert Lévy com fotografias de sua autoria e publicado em 1886, realiza um registro documental amplo e meticuloso do trabalho de grandes arquitetos que atuaram nos Estados Unidos, na virada do século XIX para o XX, enaltecendo suas obras e permitindo flagrar cidades em pleno processo de transformação. Washington, Boston, Nova Iorque têm seus arranha-céus e residências escrutinados pelo fotógrafo francês que logrou documentar prédios emblemáticos poucos anos após sua construção. Lévy registrou os trabalhos de profissionais como Henry Hobson Richardson e George Browne Post, que estavam revolucionando a arquitetura americana, despojando-a de referências neoclássicas e utilizando-se da reinterpretação de outros estilos europeus.

Figurar no álbum era um sinal de distinção, e os prédios retratados foram também documentados em periódicos norte-americanos especializados, nos quais eram objeto de descrições minuciosas e longos debates. As fotografias de Lévy, assim disseminadas, funcionavam como modelos, permitindo a reprodução pelos arquitetos de todas as partes do país. A arquitetura mostrada no álbum é bastante diversificada, sendo sua especificidade dada pelo uso de novos materiais e técnicas construtivas, mas também por questões plásticas, sobressaindo o estilo revivalista.

Uma das características das imagens presentes nesse álbum é que não há registro de detalhes arquitetônicos; os prédios são incluídos em sua totalidade, sem elementos obstrutivos impedindo a apreciação das construções. Algumas fotografias foram tiradas do alto e poucas são frontais; Lévy privilegiava o enquadramento em diagonal, com o uso de ângulos suaves. O entorno das construções fotografadas raramente é mostrado e, quando aparecem mais detalhes das ruas, elas invariavelmente estão também em obras. Homens trabalhando e materiais de construção estão presentes em diversas imagens, sinalizando que as cidades retratadas se encontravam em pleno processo de transformação.

Os indivíduos fotografados estão quase sempre posando e olhando diretamente para a câmera. Uma marca registrada de trabalho de Lévy nesse álbum é a recorrência com que homens e mulheres, sozinhos ou em grupos, são retratados nas janelas dos edifícios. Seja em prédios comerciais em Chicago, seja em aprazíveis residências, sempre é possível ver alguém posando à janela. Mais do que informar proporções, trata-se de um toque de vida na fotografia de arquitetura.

O álbum L’architecture américaine, hoje raríssimo, é composto de três volumes e, na versão existente no Arquivo Nacional, contém 119 fotografias. O primeiro volume, do qual a maioria das imagens desta exposição virtual foi tirada, é o único do acervo que contém índice e está dividido em: edifícios públicos, edifícios religiosos, grandes estabelecimentos privados e casas de comércio. Os volumes dois e três apresentam imagens de residências. A obra foi editada em Paris, pela Librairie Générale de l’Architecture et des Travaux Publics André, Daly Fils & Cie. O álbum integra o fundo Paulo Assis Ribeiro e é apontado como o primeiro sobre arquitetura americana a ser publicado na França.

Fim do conteúdo da página